segunda-feira, 24 de novembro de 2008

DUCHAMP: O REIVENTOR DA ARTE

(Duchamp fotografado ao lado de alguns projetos em 1912 – foto divulgação)




Este texto surgiu como condição necessária para concluir a disciplina de Crítica Teatral[1] da FAP – Faculdade de Artes do Paraná. Trata-se do relato de pesquisa da obra do artista Marcel Duchamp (1892 – 1968), a partir do estímulo recebido após a leitura do ensaio A obra de arte na era da sua reprodutibilidade técnica do pensador alemão Walter Benjamin (1892 – 1940). O mais curioso é que o que era condição necessária se transformou em condição essencial não só para concluir a disciplina, mas para entender o momento histórico em que a obra de arte também passou a ser sinônimo de tradução conceitual de uma idéia. Uma prazerosa aventura de pesquisa e revelações.
Para uma pessoa como eu, que já estava cansado de ouvir falar em Duchamp, mas que ainda não tinha se dedicado a mergulhar no solo fértil de descobertas duchampianas, a principal conseqüência da produção deste texto é a constatação de como esse gênio foi tão importante para a ressurreição da arte no cenário mundial. Uma descoberta dessas, mesmo que tardia, vale a pena ser comemorada novamente.


1- UM VISIONÁRIO SOLITÁRIO
Divisor de águas na história da arte, Marcel Duchamp, foi importantíssimo para a reviravolta que ocorreu na maneira de se relacionar com a obra de arte no século passado. Visionário, ele talvez não imaginasse a total influência que exerceria para a arte contemporânea do nosso século. Provocador, ele atribuiu ao observador a síntese que faltava para caracterizar o estado inacabado da obra (obra aberta)[1], que só seria completado com a interpretação dos seus observadores.
Duchamp foi o que podemos chamar de precursor da instalação nas artes plásticas. Nele podemos identificar todo o principio da Performance e da Pop - art. Através das suas criações, a história da arte tomou novos rumos e desencadeou uma série de novos “ismos” nos períodos artísticos. O surrealismo foi um deles. A maneira pela qual a arte passaria a ser vista do futuro tem sua raiz em Duchamp. Com ele podemos também identificar o principio da arte conceitual e, sobretudo, como disse anteriormente, da arte contemporânea.
Os comentadores dizem que o movimento inaugurado por Duchamp foi realizado, na época, solitariamente pelo artista que, apesar de não produzir uma grande quantidade de obras ao longo de sua carreira, sua produção, fez despertar uma série de seguidores na posteridade.

2- O DADAÍSMO.
Segundo H. W. Janson e Anthony F. Janson, o genocídio organizado durante a primeira guerra mundial contribuiu para o desespero que levou Duchamp a colaborar, como protesto, no movimento artístico denominado Dadá ou Dadaísmo. Sua intenção era deixar claro ao publico que todos os valores, morais ou estéticos, tinham perdido seu valor em conseqüência da primeira guerra mundial. O Dadaísmo pregava a antiarte e o absurdo aparente.
A princípio, o movimento não envolveu nenhuma estética específica, mas talvez a expressão Dadá tenha surgido do poema aleatório e do ready-made de Duchamp. Sua tendência extravagante, baseada no acaso, serviu de base para o surgimento de inúmeros outros movimentos artísticos do século XX, entre eles o Surrealismo, a Art Conceitual, a Pop Art e o Expressionismo Abstrato.
Graça Proença, escreveu que “os dadaístas propunham que a criação artística se libertasse das amarras do pensamento racionalista e sugeriram que ela fosse apenas o resultado do automatismo psíquico, selecionando e combinando elementos ao acaso” (PROENÇA, pág. 165). Dessa forma, o que os dadaístas buscavam não era apenas mais uma atitude plástica, desenvolvida artesanalmente pela técnica do artista, mas uma postura crítica e satírica aos valores tradicionais, questionados após a primeira grande guerra.
Dentro desse contexto artístico e social que as principais provocações de Marcel Duchamp se estruturaram. O artista, que já tinha provocado, com suas pinturas, a arte impressionista e cubista, agora estava reestruturando aquilo que nós chamaríamos de arte quase sessenta anos depois. A arte, após as primeiras provocações de Duchamp passou, a longo tempo, a ser vista também como idéia e intenção do artista ao se relacionar com o publico e não apenas como seu trabalho técnico e artesanal. A arte, depois de Duchamp nunca mais deixou de trabalhar com os conceitos.



(Nu descendo escada, pintura de Duchamp onde
incomodou os cubistas tradicionais da época)

3- A ARTE NA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL.
A Revolução Industrial provoca uma ruptura nas artes plásticas no século XIX. A ampliação e a transformação dos centros urbanos impõem uma nova forma de conceber a realidade, tornando-se ultrapassada a antiga visão imposta pelo Feudalismo e que o Renascimento não conseguira eliminar inteiramente. A máquina foi suplantando o trabalho humano, uma nova relação entre capital e trabalho se impôs, novas relações entre nações se estabeleceram e surgiu o fenômeno da cultura de massa, entre outros eventos.
As técnicas de reprodução mecânica que surgiram a partir de então, o advento da fotografia e a própria máquina, colocaram o artista em “cheque-mate” exigindo dele uma resposta. Essa análise já foi executada e pensada por Walter Benjamin que discute as novas potencialidades artísticas, essencialmente numa dimensão política, decorrentes da reprodutibilidade técnica. Antes da Revolução a experiência da obra de arte era condicionada pela sua aura, isto é, pela distância e reverência que cada obra de arte, na medida em que é única, impõe ao observador. Benjamin constata que “no início do século XX, a reprodução técnica tinha atingido um nível tal que começara a tornar objeto seu, não só a totalidade das obras de arte provenientes de épocas anteriores, e a submeter os seus efeitos às modificações mais profundas, como também a conquistar o seu próprio lugar entre os procedimentos artísticos” (BENJAMIN, pág. 06). .O aparecimento e o desenvolvimento de novas formas de arte, em que deixa de fazer sentido a distinção entre obra original e cópia, traduz-se no fim dessa aura, o que liberta a arte para novas possibilidades, tornando o seu acesso mais democrático.
Nessa época, nos escreve Ferreira Gullar, Duchamp e Bransusi foram visitar o salão da aviação e ao serem surpreendidos pela beleza das hélices ali expostas ouve-se um dos dois dizer: “A arte acabou!” Era Duchamp dizendo a Brancusi que dificilmente algum artista faria obra melhor. Duchamp com certeza acreditava que nem ele pudesse fazer melhor. Aí, de certo, tinha brotado a idéia de Duchamp de, mais tarde, mandar para o Salão dos Independentes de Nova York (1917) um urinol, comprado em uma loja de construção, como obra de arte. Claro, sua obra foi rejeitada pelos curadores e foi Duchamp mesmo que tratou de divulgar o ocorrido escrevendo um artigo publicado numa revista da época. Esse fato lhe trouxe muita repercussão.

No universo da cultura e das artes, com suas antevisões do futuro, Duchamp é uma espécie de rito de passagem: ponto em que a era mecânica industrial sai do seu apogeu, dando início à era eletrônica, pós-industrial. È por isso também que a Art-pop, na sua relação ao desmesurado crescimento dos meios e produtos da cultura de massas, não foi senão a explicitação de uma atividade estética inseparável da crítica que já estava implícita em Duchamp. (SANTAELLA, Pág. 144)


Assim, “à medida que a indústria povoa o mundo de objetos feitos (não-natureza), a própria obra de arte deixa de ser representação para se tornar também objeto” (GULLAR, pág. 73), ou seja, a obra de arte se torna tão impessoal quanto um produto da máquina e tão objetiva quanto uma mercadoria. Dessa forma, Duchamp, com seus questionamentos, dá novo sentido a arte e a coloca em outro patamar até então desapercebidos pelos artistas da época.

4- O REDY-MADE.
O redy-made de Duchamp propõe um lugar intermediário entre a vida e a arte. Duchamp foi o responsável pela atitude que transporta um elemento da vida cotidiana, a priori não reconhecido como artístico, para o campo das artes.
O principio do rady-made fundamenta uma das vertentes mais importantes da arte conceitual, ou seja, sua criação não pressupõe uma atividade manual (artesanal) do artista. O que esta em cheque é um saber mental do artista ao se deter sobre sua obra. Trata-se de uma reflexão crítica sobre o cotidiano onde o limite é todo o mundo circundante.

Ao tirar um objeto comum do seu contexto usual e levá-lo à categoria de arte, ele anunciava ao mundo: a habilidade manual do artista já não basta para definir uma obra. Na nova realidade, tomada pelas mais diferentes possibilidades de reprodução, o pensamento do autor por trás do seu trabalho – enfim, a sua idéia – se torna o mais importante. (...) A escolha do objeto que sofria esse deslocamento partia do artista, e isso ganhava valor” (KATO, pág. 38).


Duchamp com sua obra desmistifica a figura do artista, pois “o rady-made, como objeto industrial sem qualquer apelo estético, torna-se paradigma de uma operação na qual a autoria é compartilhada” (FREIRE, pág. 35). Nesse contexto, a obra de arte, que passa a existir somente conceitualmente, é realizada duas vezes. Primeiro pelo artista e depois pelo observador. Se o observador participa da criação, pois apreende segundo suas próprias referências aquilo que o artista desejou mostrar, os diferentes contextos de exibição são também fundamentais para a atividade criativa do público.
O rady-made, ao desconfigurar lugares comuns, deixa de ser um objeto comum e industrial ao ser levado para exposição em lugares institucionais como galerias e museus. Trata-se da interferência do objeto no espaço e vice-versa. A partir daí, qualquer objeto industrial, interferido, ou não, pelo artista e colocado a exposição, pode estimular diversas reflexões críticas no publico visitante ou simplesmente ser admirado pelas suas linhas, formas ou contornos que não seriam percebidos no seu lugar cotidiano.

O artista torna-se um manipulador de signos, mais do que um produtor de objetos de arte, e o espectador, um ativo leitor de mensagens mais do que um contemplador estético ou um consumidor do espetáculo. È por isso que o procedimento do redy-made duchampiano, a fotomontagem e a apropriação do pop são significativos ao apontar para o papel da arte como signo social, misturado a outros signos num sistema de produção de valor, poder e prestígio (FREIRE, pág. 38).



(Fonte, redy-made enviando e rejeitado, em 1917, para a
mostra dos artistas independentes de Nova York – Foto divulgação)

Entre os principais redy-mades duchampianos estão A fonte, um urinol comprado em loja de construção e enviado a mostra Independents Art Exhibition em Nova York no ano de 1917. Quem assinou foi um pseudônimo de Duchamp denominado R. Mutt e, como o artista já esperava, a obra foi recusada na mostra.



(Roda de bicicleta, obra de 1915 – foto divulgação)


Outra das mais conhecidas obras foi Roda de bicicleta, talvez o primeiro redy-made feito em seu atelier em 1913. A original foi jogada fora pela irmã de Duchamp como uma velharia qualquer. A que conhecemos é uma segunda versão feita em Nova York depois de deixar Paris em 1915.

Duchamp foi o primeiro a se dar conta das repercussões que os objetos industrialmente produzidos, quer dizer, objetos-sígnos, traziam para a arte. Nas suas enigmáticas contravenções, ele estava ironicamente evidenciando que, assim como qualquer imagem tem um caráter de signo porque se trata obviamente de uma forma de representação, qualquer objeto também tem uma natureza sígnica ou quase-sígnica que lhe é própria e que é ditada pela sua funcionalidade. (SANTAELLA, Pág. 144)

A invenção do redy-made hoje pode soar apenas como mais uma provocação de um artista plástico criativo, mas entendendo o que foi essa postura no contexto cultural do início do século XX pode-se concordar que é tarefa para gênio.


(Porta-garrafas, junto com a 1ª. Versão da Roda, está
entre os dois primeiros redy-mades criados em 1913)


CONCLUSÃO.
O principal legado de Marcel Duchamp para o futuro da arte foi a maneira como nós, observadores das obras, nos relacionamos com os objetos de arte a partir de então. Essa constatação vale tanto para as obras das artes plásticas quanto para os filmes, os espetáculos teatrais e também para a música.
A afirmação acima, em outras palavras, refere-se ao “lugar” da arte na relação do observador com a obra de arte, ou seja, a arte verdadeiramente não está nem no objeto contemplado e nem no observador que o admira. O lugar da arte esta no espaço intermediário entre essa relação, isto é, no contado entre observador e a obra. Um quadro isolado, sem a contemplação de um único observador é apenas um objeto qualquer e somente quando ele é admirado é que se torna arte. O mesmo vale para um espetáculo, um filme e todas as demais artes que só se completam quando existe tal relação. A arte passou então, mais do que tudo, a ser vista como conceitual.
A importância do observador, dessa forma, é imprescindível para a existência da arte e sua evolução. Na arte contemporânea, todas as manifestações artísticas se desenvolvem sobre esse princípio. A função da arte é tida hoje mais como transformadora da realidade, do que por mera admiração estética e contemplativa.
A arte contemporânea quer provocar, quer transformar o estado cotidiano das coisas e relações do mundo. Os artistas inventam códigos a serem desvendados pelo publico, inventam estímulos para provocar os sentidos da platéia e apresentam esses processos com a intenção de questionar, muitas vezes, até mesmo a função da arte no presente momento.
O público e os artistas, por um lado, podem considerar todas as novas propostas apresentadas na contemporaneidade, podem identificar diversos conceitos novos e muitas inovações artísticas, porém, por outro lado, devemos ter sempre bem esclarecido que a raiz de todas essas manifestações artísticas provém da ruptura instaurada por Marcel Duchamp na história da arte.
O próprio Duchamp, apesar de gênio e visionário, talvez não tivesse imaginado o desdobramento que seus conceitos e provocações pudessem ter alcançado no percurso da arte até aqui. Duchamp reinventou a roda e salvou a arte da sua morte.

BIBLIOGRAFIA

BENJAMIN, Walter. A obra de arte na era da sua reprodutibilidade técnica. In: Textos escolhidos (coleção Os pensadores) São Paulo: Abril Cultural, 1980.

FREIRE, Cristina. Arte conceitual. Rio de Janeiro: Zahar Editor, 2006

GULLAR, Ferreira. Argumentação contra a morte da arte. Rio de Janeiro: Editora Revan, 1996.
JANSON, H. W. e JANSON, Anthony F. Iniciação à história da arte. São Paulo: Marins Fontes, 2007.

KATO, Gisele. O homem que reinventou a roda. In: Revista Bravo. Edição no. 131 São Paulo: Abril Cultural, 2008.

PROENÇA, Graça. História da arte. São Paulo: Editora Ática, 2006.

SANTAELLA, Lúcia. Culturas e artes do pós-humano: Da cultura das mídias à cibercultura. São Paulo: Paulus, 2004.


[1] Este parênteses é um grifo meu.
*FAP – Faculdade de Artes do Paraná.
[1] Disciplina oferecida aos alunos do 4º. Ano de Bacharelado em artes cênicas (interpretação Teatral) em 2008. Tal disciplina foi ministrada pela professora e chefe do departamento de teatro Lilian Fleury.


terça-feira, 18 de novembro de 2008

TEATRO CONTEMPORÂNEO

(ABSTRATOS - foto de François Sumi)


Já disse, em outra oportunidade, que não tenho preconceito contra linguagens teatrais. Consigo gostar tanto de um espetáculo de “teatrão” bem feito quanto de um espetáculo de teatro físico também bem feito. O importante é a forma, o acabamento e o discurso. A relação com o público e sua aceitação.
Porém, há algo de instigador no teatro contemporâneo que me chama muito a atenção. Modismo no teatro a parte, mas as infinitas possibilidades de se trabalhar com o teatro hoje fazem com que o contemporâneo ganhe cada vez mais adeptos.
Dentro do contemporâneo, a dramaturgia pode se estabelecer por qualquer outro viés que não seja, necessariamente, o texto pronto, escrito anteriormente da montagem e da produção. A dramaturgia pode partir do corpo, de imagens, de sensações e por várias outras opções. Por sua vez, o discurso também pode não ser linear e contínuo. Pode-se ver quebras, pausas, silêncios e talvez esperar que a platéia se comunique com as mensagens do espetáculo via sensações e não apenas pelo entendimento racional.
Quanto às referências, são muitas, ou melhor, são todas. Tudo que faz parte do mundo e em todas as áreas pode ser material criativo para o ator e o teatro contemporâneo. As linguagens se misturam, o teatro se apropria de várias outras artes se tornando um discurso híbrido. Trás a música, a dança, o vídeo, a fotografia, enfim todas as artes cênicas e visuais.
Talvez um dos principais objetivos do teatro contemporâneo nem seja o que se conta, mas como se conta. A forma é superior ao conteúdo e, por sua vez, o conteúdo é digerido pelo publico que, cada vez mais, procura pelo canal de comunicação com os espetáculos. Existem processos colaborativos, criações coletivas, solos, parcerias entre profissionais de várias artes, enfim, uma mistura de processos e escolhas que tornam a opção de ver teatro uma prática cada vez mais constante entre o público curitibano.
Em Curitiba, destaco o excelente trabalho desenvolvido pelas companhias Obragem – Teatro e Cia, Cia Senhas de Teatro, Companhia Brasileira e, em outra instância, a Vigor Mortis, entre outras. Há em cada espetáculo dessas companhias sempre algum novo mistério e código a serem desvendados. Cada novo espetáculo é uma nova aventura pra dentro das possibilidades criativas de cada companhia citada. Quem ainda não viu, está perdendo tempo.
Descubram.
Viagem!
Talvez a gente se encontre.

domingo, 16 de novembro de 2008

ABSTRATOS


RELATO DE UM PROCESSO

Abstratos foi minha prova pública de conclusão do curso de bacharelado em artes cênicas pela FAP – Faculdade de Artes do Paraná. É interessante visualizar agora, depois de concluído, como se desenrolou tal processo de construção teatral.
Minha atuação se deu em três níveis diferentes e, por outro lado, complementares no espetáculo. Criei e desenvolvi o cenário, o figurino e fazia parte também do elenco de três formandos em interpretação.
Na interpretação, tinha ao meu lado duas excelentes atrizes: Camilla La Souza e Verônica Rodrigues. Ambos, tínhamos todos os interesses e preocupações normais de qualquer aluno formando que se filia a algum projeto de um diretor.
De início, não gostamos do texto, mas resolvemos unir nossas forças e aceitar a parceria com o também formando em direção teatral André Wormsbecker. No decorrer do processo, continuamos a nos derrapar entre as insatisfações com o texto. Mesmo assim, lutamos e continuamos a nos dedicar a tão difícil missão: representar bem e satisfazer principalmente aos nossos próprios desafios como atores.
Nos colocamos a serviço do texto e da direção. Palpitamos, sugerimos, afirmamos e negamos algumas escolhas. Sobrevivemos e, ao que tudo parece, saímos vitoriosos e mais experientes.
Quanto a criação artística e visual do espetáculo, ou seja, o cenário e figurino, propus que o teatro se apropriasse da década de 60, época em que o texto foi escrito, através do contraste entre o preto e o branco. Sobreposições de formas, linhas e estampas estavam já no projeto inicial da arte. Fui contestado, no bom sentido, e alertado pelos professores orientadores do projeto para cuidar dos excessos que tal escolha poderiam apresentar. Porém, minha intuição dizia que eu deveria investir nessa linguagem e opção estética para o visual do espetáculo. Sempre aprovado pelo amigo diretor André, desapeguei de algumas idéias, renovei outras, aceitei sugestões de algumas outras idéias, mas o principio da criação permaneceu inalterado.
Parece que deu certo, gostaram do resultado. Eu também gostei. Comemorei com toda a equipe as nossas vitórias que felizmente foram maiores que nossos fracassos.
Teatro também se faz no coletivo, em equipe e essa é uma exigência natural para que essa arte possa se concretizar, portanto deve ser estabelecida sempre em prol do bem comunitário. Esse exercício nos valeu até mais que os resultados. Vencemos. Entre dores e prazeres, nós vencemos nosso desafio. Abstratos era inicialmente exemplo do teatro clássico brasileiro, quebramos um pouco essa formatação, estabelecemos uma nova relação e nos encontramos com novas possibilidades de discurso.
Obrigado a equipe de Abstratos e ao convite do diretor André, assim como a parceria com as atrizes citadas. Obrigado aos orientadores Chico Nogueira, Luciana Barone e Márcio Mattana, ambos atores/diretores e professores da FAP. Obrigado aos queridos parceiros de turma e ao demais publico, parentes e amigos, que nos prestigiaram. Valeu!



Ficha técnica:
Direção: ANDRÉ WORMSBECKER
Elenco: CAMILLA LA SOUZA, PAULO VINÍCIUS e VERÔNICA RODRIGUES.
Cenário e figurino: PAULO VINÍCIUS
Cabelo e maquiagem: ANDREA TRISTÃO
Iluminação: AUGUSTHO RIBEIRO
Projeções em vídeo: ANDRÉ WORMSBECKER
Participações especiais: LEONARDO TELLES E AMANDA BARANOSKI

CONVERSINHA AFIADA




Como disse Clarice Lispector: “Voltei. Fui existindo”.
Fiquei pensando no que poderia dizer a respeito da moda e o que realmente interessa a vocês leitores. No fundo da vontade, encontrei a motivação para fazê-lo.
Vou falar sobre comportamento.
Qual a maneira pela qual escolhemos representar o nosso papel de ator-social, ou seja, como nos apresentamos no grande espetáculo público que é a própria vida, cheia das suas relações sociais, de discursos que proferimos mesmo inconscientemente no decorrer do dia-a-dia? Espero também compreender melhor com tudo isso a maneira pela qual exerço o meu insignificante papel de apresentador de mim mesmo perante o mundo.
Acredito, sinceramente, que nosso principal veículo de comunicação é o nosso próprio corpo. Essa comunicação visual, que se dá pela imagem e presença do nosso corpo, fala antes e mais alto do que qualquer palavra ou som que proferimos. A presença do nosso corpo fala e a maneira pela qual ele se movimenta também. Dessa forma, o que estamos colocando sobre o nosso corpo? Como estamos vestindo nosso discurso por cores, modelos, tecidos, (des)combinações e escolhas que fazemos? Como?
Conheci um corpo que se movimentava muito e se cobria de cores e modelos extravagantes. Esse, sem dúvida, nunca me passou qualquer estado de insegurança e fragilidade. Ele se colocava de forma autoritária aos meus olhos.
Educação também está inteiramente relacionada à moda. Ser mal educado é estar totalmente fora de moda. Esses são muitos e estão por toda parte. Se for um deles, tranque-se em casa, não saia nem na calçada. Ninguém é obrigado.
Se quiserem saber mesmo a minha opinião sobre moda, posso acrescentar que frescura, por exemplo, também está super fora de moda. Gritinhos, frescurinhas, comportamentos de qualquer pessoa fresca e mimada, não há quem tolere mais na nossa sociedade. Ou melhor, talvez ainda exista alguns representantes da nossa espécie que se dão à paciência de agüentar e incentivar pessoas assim a proliferarem e cruzarem o nosso caminho. Sejamos práticos, quem achar bonito dar showzinhos e pitis por aí, não me cumprimentem quando se encontrarem comigo, não tenho paciência com vocês. No máximo, dou um conselho: comprem um livro, leiam; vale tudo, até Paulo Coelho. Porém se ocupem, façam algo de útil por vocês mesmos.
No mais, branco e preto estão em alta, mas sejam criativos, por favor, deixem que a personalidade de cada um seja realmente o comandante das vossas escolhas. Vale quebrar com uma peça de qualquer outra cor contrastante e aberta, vale quebrar o sofisticado com o rústico, quebrar inclusive a tendência e não usar. Só de propósito. Fazer greve de uniforme. Seja diferente, seja alguém que tenha algo realmente interessante a dizer para as outras pessoas. Seja alguém que faça a diferença, para melhor, na vida das pessoas que encontrar pelo caminho.
Esteja na moda. Sempre. Afinal de contas, leveza, gentileza, espontaneidade e originalidade sempre estiveram na moda. Seja feliz. Isso é estar na moda.