quarta-feira, 27 de maio de 2009

ODE A CHICO NOGUEIRA


(Chico no espetáculo METAMORPHOSIS em 2005 - foto de Elenize de Barro)

Às vezes convido artistas interessantes para estarem aqui no Blog. Dou sorte de entrevistar somente pessoas que valem à pena. Algumas histórias são feitas para se contar. Esta que agora conto, por exemplo, é uma delas.
Recebi na tarde do ultimo sábado um dos atores mais conhecidos do teatro paranaense, com seu tom espontâneo de um Lord inglês, Chico Nogueira carinhosamente aceitou meu convite para um bate papo. Entre todos os fatos e as curiosidades relatados sobre sua carreira e sobre a história do teatro curitibano, que valeriam um livro, algumas passagens poderão ser conhecidas no texto que se segue.
Conheci o querido Chico nos corredores da FAP – Faculdade de Artes do Paraná, logo no primeiro ano que cheguei. Sempre solicito, ele não nos escondia o jogo, com prazer sempre nos revelou seus truques na arte da representação. Sempre esteve presente.
Além de ator e diretor, Chico desde 1985 cria e desenvolve algumas das trilhas mais interessantes que ouvimos todo ano em alguns dos melhores espetáculos colocados em cartaz nos palcos curitibanos. O prazer pela sonoplastia já lhe rendeu muitos prêmios importantes. A fotografia também o destaca como um dos fotógrafos de espetáculos mais importantes do Paraná. Seu primeiro registro fotográfico de um espetáculo foi em 1978, inspirado pelo trabalho de Jack Pires. Como ator, entre filmes e espetáculos, tem no currículo mais de 40 trabalhos profissionais. Sua mais recente atuação foi na interpretação do cineasta Alfred Hitchcock no espetáculo HITCHCOCK BLONDE, uma realização da Companhia Vigor Mortis, dirigida por Paulo Biscaia Filho. A semelhança física com o cineasta deu um sabor a mais aos olhos dos espectadores.

(cena do espetáculo HITCHCOCK BLODE em 2008 - foto de Lúcia Biscaia)

ESCOLHIDO PELO TEATRO

Francisco Carlos Nogueira nasceu em Curitiba. Se contarmos desde a primeira vez que se apresentou em publico, ele está para completar cinquenta anos de palco. Apesar de sua carreira profissional ter iniciado apenas em 1974, desde os cinco anos de idade ele já se apresentava nos recitais improvisados por seus vizinhos estrangeiros no bairro do Portão, onde vive até hoje. Seus pais, apesar de não serem também artistas, adoravam circo, música, cinema e teatro e sempre carregavam o pequeno Chico para os prazeres culturais.
Além do estímulo proporcionado por seus pais e vizinhos, Chico teve também a sorte de ter uma família de circo morando ao lado de sua casa, que inveja! Era tudo o que um pequeno artista poderia sonhar. Os Irmãos Queirolos, parentes da atriz Bibi Ferreira, quando instalavam seu circo no bairro do Portão, alugavam uma residência na mesma rua onde ele morava, o que lhe proporcionou um contato íntimo com o trabalho e a vida dos artistas circenses. Vem também dessa época o seu interesse pela sonoplastia, pois era muito curioso sobre o que acontecia dentro da cabine de som, onde as trilhas dos espetáculos apresentados eram operadas ainda de forma artesanal e improvisada.
A música também entrou muito cedo na vida de Chico, pois tinha na família e como amigos dos pais alguns músicos. Acostumou-se a ouvir vários estilos, da MPB ao clássico, prática que contribuiu consideravelmente na formação do seu repertório eclético.


(Chico no espetáculo EQUUS em 1995 - foto de Roberto Reitembach)


Com a chegada da televisão em Curitiba, quando ele contava seis anos de idade, em 1960, passou a acompanhar os teleteatros apresentados pela TV Paranaense – Canal 12 e pela TV Paraná Canal 06 - conhecendo então o trabalho dos atores curitibanos que ali se apresentavam, como Ary Fontoura, Édson D´Ávila e Odelair Rodrigues. Era a paixão pela arte da interpretação que pulsava dentro do pequeno escolhido. A mesma paixão com que ele agora se recorda dessas primeiras lembranças que estimulara sua carreira. Aos sete anos já participava dos grupos de jovens que se reuniam para fazer teatro nas igrejas e nas escolas. Na adolescência viu nascer o TCP – Teatro de Comédia do Paraná, projeto criado pelo governador Ney Braga, que possibilitou montagens históricas e a vinda de grandes nomes do teatro nacional para Curitiba, como Paulo Autran, Cláudio Correia e Castro, Ivan de Albuquerque e o casal Paulo Goulart e Nicete Bruno, que chegaram inclusive a residir na capital paranaense por alguns anos.
Em 1985 dirigiu seu primeiro espetáculo, Por telefone, texto de Antônio Fagundes e que tinha no elenco Mário Schoemberger e Regina Bastos. Esse espetáculo marca a inauguração do teatro no SESC da Esquina em Curitiba e também a primeira sonoplastia que ele assinou.
Chico Nogueira graduou-se em Relações Internacionais e em Ciências Contábeis. Foi bancário durante os vários anos em que, paralelamente, trabalhava também como ator. Depois do triste incidente que causou a morte de um dos seus irmãos, em 1986, decidiu, incentivado por seu irmão doze anos mais velho, e aprovado pela mãe, deixar o teatro assumir os rumos da sua carreira e da sua felicidade.
No mesmo dia que se retirou do banco, aceitou o convite do amigo, o ator e diretor Enéas Lour, para integrar o elenco do espetáculo A história de muitos amores dirigido por Fátima Ortiz. Viajaram com o espetáculo durante um ano por todo o Estado do Paraná.

(Um lugar perfeito em 2005 - Foto de Fernando Dias)


As oportunidades foram aparecendo e Chico foi agarrando todas. Foi diretor da Cinemateca de Curitiba de 1991 a 1994, diretor do Museu da Imagem e do Som de 1991 a 2002, e professor da Faculdade de Artes do Paraná a partir de 1988, função que desenvolve até hoje.
Por duas vezes foi ao exterior estudar. Também por duas vezes viu a morte passar bem pertinho, com complicadas cirurgias que teve de enfrentar. Mas, recuperado dos sustos e apesar das dificuldades encontradas na vida e na arte, comum a nossa vida de artista, Chico não se arrepende de permitir que o teatro lhe escolhesse definitivamente. Apesar de falar várias línguas e de dominar muito bem as palavras, nem ele conseguiria me descrever o brilho dos seus olhos, que reluziam quando me contava a sua história.
Salve Chico!

domingo, 10 de maio de 2009

ROMEU E JULIETA - Montagem de Nena Inoue e Mauricio Vogue atualizam clássico de Shakespeare no Guairinha

(Cena do espetáculo - foto de Ale Haro)
A história de Shakespeare está toda ali, atualizada enquanto dramaturgia e encenação. Não fica no meio caminho, atinge o objetivo. Vale a pena e é uma boa opção para quem quer ver um espetáculo de qualidade.
Originalmente a montagem é destinada ao público jovem, mas acredito que tem agradado todas as gerações. Não espere ver nada de inédito, o que é quase impossível no cenário artístico hoje, mas as referências e apropriações são muito bem absorvidas, elaboradas e aplicadas.
No elenco há algumas revelações como a jovem atriz Daphine Bozaski que ao lado do também jovem ator Pedro Inoue formam um belo e convincente casal para viver os protagonistas. Estão bem e apesar da pouca idade já revelam um futuro promissor nos palcos. São carismáticos, estão preparados e convencem. Pedrinho já brilhou outras vezes como no espetáculo O menino Maluquinho de Fátima Ortiz. Valem a pena.
Um show a parte no espetáculo é a luz de Waldo Leon que, ao meu ver, é atualmente o melhor iluminador da cena curitibana. Criativo, Waldo desenha o espaço e elabora efeitos simples que dão acabamento à encenação não menos criativa de Maurício e Nena. Aliás, falando de encenação, há tempos admiro também as soluções bem criativas de Maurício Vogue que sempre presenteia o público com belas imagens.
Na adaptação do texto vemos referências tanto da filmagem clássica de Franco Zefirelli quanto da versão contemporânea de Baz Luhrmann para o texto de Shakespeare, mas na ficha técnica vemos que o grupo também foi assessorado pela especialista em Shakespeare, professora doutora Margarida Rauen e também pelo consultor de dramaturgia Márcio Mattana.
No mais tudo se encaixa e faz emocionar nesse processo colaborativo formado por veteranos e novatos, diretores e atores.
O espetáculo fica em cartaz até 24 de maio. As sessões são sempre aos sábados e domingos as 19:00h.
Não deixem de ver.

sexta-feira, 1 de maio de 2009

O QUE EU GOSTARIA DE DIZER

(cena do espetáculo dirigido por Marcio Abreu - foto divulgação)
Gosto muito do trabalho da Companhia Brasileira de Teatro que é dirigida por Márcio Abreu. Do seu repertório vi os espetáculos Suíte 1, Apenas o fim do mundo, Volta ao dia e agora O que eu gostaria de dizer, que esteve em cartaz no Teatro José Maria Santos no período de 17 a 26 de Maio em Curitiba.
A estética ou poética teatral da Companhia Brasileira é algo que sempre me agradou muito principalmente pela forma que, segundo minha análise, sempre falou mais alto que o conteúdo. Apostos são valorizados na dramaturgia, repetidos com diferentes intenções e dão força essencial para a construção das interpretações. Com relação a encenação, alguns elementos também se repetem como as refeições e as canções que são inseridas no decorrer dos espetáculos. Tais elementos sempre funcionam como uma estratégia de manter a cena no tempo presente e atualizam os elementos datados que os cenários costumam apresentar. Vários signos e referências convivem harmoniosamente dentro da estética contemporânea da companhia Brasileira.
O que eu gostaria de dizer, contudo, é um espetáculo diferente dos que estamos acostumados a ver e, apesar da refeição que é mantida durante a apresentação e da canção, que dessa vez não é cantada, mas apresentada como argumento para a construção da cena, outros elementos na relação texto-ator são inseridos na montagem. Não quero dizer com isso que são melhores e nem piores, apenas diferentes. Talvez eu tenha percebido essa diferença principalmente no tom em que o texto é dito. As repetições ainda estão presentes, mas de forma diferente.
Um elemento que também acentua essas diferenças é a presença de Luis Melo no elenco. Sempre seguro do seu trabalho e dono da relação que se instaura entre ambiente e platéia, Melo tem sempre uma presença muito forte que, em certo sentido, se coloca incisivamente nos trabalhos em que participa, coisa dos grandes atores que está além da nossa capacidade de julgamento. Por sorte, os outros dois atores que dividem o palco com ele, Bianca Ramoneda e Márcio Vito, estão à altura e colaboram também com o novo tom apresentado pela Companhia Brasileira ao estarem totalmente inseridos dentro da mesma linguagem.
A dramaturgia, construída em processo colaborativo entre atores e diretor, fala da existência e das relações humanas a partir de três diferentes pontos de vista costurados por um mesmo viés poético. É um bom lugar para se pensar sobre a vida.
A temporada em Curitiba teve casa lotada em todas as sessões e só conseguir ver o espetáculo numa sessão extra do último dia da temporada a convite de Elenize Dezgeniski, fotógrafa contratada da Companhia e minha amiga querida.
Valeu e, parafraseando Gonçalo M. Tavares em citação no espetáculo, “não há melhor lugar para estar do que estar contente”.
Para saber mais sobre o trabalho da Companhia Brasileira visite http://www.companhiabrasileira.art.br/