(Espetáculo SOLO - foto de Roberto Reintenbach)
No final do Mês de Outubro de 2004 eu cheguei a Curitiba. Ainda não conhecia o trabalho das companhias e grupos daqui. Na aventura de conhecer os espaços culturais da cidade e o trabalho dos artistas, caí de pára-quedas no teatro Cleon Jaques no Parque São Lourenço. Ainda na sala de espera do teatro encontrei uma platéia tímida e silenciosa. Tensão e curiosidade. Em cartaz o espetáculo SOLO da Obragem Teatro e Cia. Ao final do espetáculo a platéia parecia a mesma, tímida e silenciosa, porém certo brilho no olhar daquelas pessoas me fazia adivinhar que, por dentro, estavam tão inquietas e incendiadas quanto eu. Eu estava mudo.
Anos se passaram e durante esse tempo eu continuei a acompanhar a pesquisa e o trabalho da Obragem. Nos tornamos amigos. Ano passado fui ver PASSOS, o mais recente espetáculo da companhia. A inquietação e a sensação de parecer estar incendiando por dentro foram as mesmas. A emoção era grande. Dessa vez, depois desses anos de amizade (principalmente pela minha tietagem), não saí mudo e correndo do teatro, fui ao camarim e fiquei falando, apesar da fuga das palavras que não vinham, falando e falando.
O que mais me encanta nos espetáculos da Obragem é a característica autoral dos seus conteúdos. A companhia não segue os “velhos” e conhecidos modismos do teatro contemporâneo, desenvolve uma pesquisa própria, capaz de lhes mostrarem até mesmo quais são as respostas que deveriam ter no início do processo e que não tinham. E eu, que sempre me considerei aventureiro, não podia imaginar que existisse tamanha coragem.
(O QUARTO - foto de Elenize Dezgeniski)
SOBRE O TEMPO.
A companhia foi fundada em 2002, pelos artistas Olga Nenevê e Eduardo Giacomini. O estímulo era romper com a forma que faziam teatro até então. Outros artistas foram convidados para a mesma viagem. O espetáculo de estréia foi ENTRE em 2003, “uma determinada decisão de pensar sobre a precariedade de comunicação no mundo em que estamos vivendo, por meio da perturbação dos sentidos” diziam Olga e Eduardo. A partir de então, os “novos filhos” dessa união, conjugal e profissional, vieram em forma de novos espetáculos: LABIRINTO também em 2003, SOLO em 2004, AMORFOU em 2005, O PONTO IMAGINÁRIO também em 2005, TUÍKE em 2006, O QUARTO – ENSAIO SOBRE A INTIMIDADE DOS CORPOS em 2007, GRUU também em 2007, WOYZECK no mesmo ano e PASSOS em 2008. Em cada espetáculo percebia-se o andamento e a evolução da pesquisa, porém a estética sempre se renovou a cada novo trabalho.
Os temas da Obragem sempre são existenciais. É sobre a tensão e as relações na subjetividade contemporânea que eles querem falar. Solidão, erotismo e morte foram alguns temas abordados pela Companhia.
Muitos artistas, de diversas áreas das artes, fizeram parte desse trajeto. Alguns partiram, outros ficaram. Outros foram, voltaram e ainda voltarão. Outros virão. Mas a alma da Obragem sempre foi alimentada, apaixonadamente, por Olga e Edu.
(WOYZECK - foto de Elenize Dezgeniski)
EU QUERO SER OLGA NENEVÊ.
Ao encerrar os trabalhos com o espetáculo LABIRINTO de 2003, Olga Nenevê assume definitivamente a direção da Companhia e, portanto, deixa a interpretação para melhor observar de fora como estavam se desdobrando as pesquisas. Como disse anteriormente, só cheguei a Curitiba no ano de 2004, portanto só fui vê-la como atriz no espetáculo PASSOS, em 2008, quando ela voltou a interpretar e a dividir o elenco com o marido, ator, figurinista e cenógrafo Eduardo Giacomini (que eu já estava tão acostumado a ver brilhar em cena). Eram apenas os dois, no palco do teatro Novelas Curitibanas. E eu parecia estar sozinho na platéia mesmo com todas as cadeiras ocupadas.
O espetáculo era perfeito, grande, lindo e perturbador. Olga preenchia todos os cantos daquele espaço com sua presença, talento e beleza. Uma das melhores atrizes que já vi em cena. A qualidade técnica do seu trabalho de interpretação, tão exata quanto o de direção, e o poder de emocionar a platéia era tudo o que eu ou qualquer pessoa, grande ou pequena, podia desejar. Um verdadeiro banho de teatro para qualquer artista, ator ou atriz, apaixonado pelo fazer teatral.
Adoro esses dois!
(TUÍKE - foto de Elenize Dezgeniski)
EDUARDO NO TELEFONE.
Eu recebi um telefonema. Foi em meados do segundo semestre do ano passado. Era o Eduardo me surpreendendo com um convite para assinar um figurino de um projeto da Companhia. Gelei de felicidade. Mais do que trabalhar com pessoas que admiro, ter sido surpreendido com esse convite, vindo de outro figurinista tão bom quanto o Edu, foi motivo suficiente para que eu vibrasse de alegria. Certas coisas entendem-se só com o coração. Coisa de gente do bem. De gente grande.
Paralelamente ao seu trabalho de ator, pesquisador e colaborador na Obragem, Eduardo Giacomini sempre atuou como figurinista e cenógrafo. Desenvolveu trabalhos para diversas produções e companhias de Curitiba. Já realizou lindos trabalhos.
Ao telefone, antes de me despedir, aproveitei e convidei-os para uma entrevista que resultaria neste texto que agora publico no Blog.
Nunca esquecerei.
(AMORFOU - foto de Sérgio Vieira)
AS IMAGENS, A CENA TEATRAL E AS TRANSFORMAÇÕES DO REAL.
O último trabalho apresentado pela companhia no final do ano passado foi a mostra do processo criativo, desenvolvido graças ao Fundo Municipal da Lei de Incentivo à Cultura de Curitiba. Tal projeto de pesquisa, além da mostra do processo, promoveu ações de criação, diálogos, oficinas e o registro em livro sobre os procedimentos realizados pela Companhia.
O livro publicado registra os processos criativos da Obragem e, além de descrições da pesquisa, desenvolvida em cada espetáculo, traz relatórios e depoimentos de vários artistas envolvidos com o trabalho da Obragem. Há também o relatório dos atores Fernando de Proença, Ronie Rodrigues, Ana Reimann, Geane Saggioratto e Elenize Dezgeniski. É uma linda publicação.
A artista Monica Infante, uma das colaboradoras já no início da Companhia, lembra no seu comentário, publicado no livro, a definição do Aurélio Buarque de Holanda para o termo Obragem: ato de construir, obra, lavor, trabalho. Essa é a melhor definição para retratar a história da Companhia.
Para quem ainda não conhece, os principais estímulos de trabalho da Companhia vêem da relação com as imagens de alguns artistas plásticos, da dança contemporânea e da forma peculiar e ímpar com que se relacionam com a palavra escrita e falada. Todas essas informações são digeridas na carne, ou seja, no corpo dos artistas que formam a Obragem Teatro e Cia e estão registradas no livro As Imagens, a Cena Teatral e as Transformações do Real.
(O PONTO IMAGINÁRIO - foto de Luana Navarro)
Faça vibrar o seu corpo e deixe que os seus sentidos adivinhem os códigos elaborados pelos espetáculos da Obragem. Permita-se e depois não se esqueça de me contar.
(PASSOS - foto de Elenize Dezgeniski)
Pense alto.
Seja grande também!
Para saber mais sobre a Obragem Teatro e Cia visite: http://www.obragemteatroecia.com.br/
Vídeos com techos dos espetáculos:
http://br.youtube.com/watch?v=oAH4CP6Zeqg - http://br.youtube.com/watch?v=swKXYwOMQvU - http://br.youtube.com/watch?v=HalMmrNsX5o - http://br.youtube.com/watch?v=HNXsUytH9Vs - http://br.youtube.com/watch?v=YIcJTmFVQ9w - http://br.youtube.com/watch?v=wD2bqB-s8Mw - http://br.youtube.com/watch?v=FC9g6PesGKE - http://br.youtube.com/watch?v=FC9g6PesGKE